Entrevista com técnico em segurança do trabalho sobre Aposentadoria Especial
Conversamos com um técnico em segurança do trabalho a respeito das principais dúvidas sobre insalubridade e aposentadoria especial. Por exemplo, você sabia que nem todas as condições que dão direito ao adicional de insalubridade garantem a contagem de tempo especial para a aposentadoria?
Por isso, convidamos o técnico de segurança do trabalho Nestor W. Neto, do blog Segurança do Trabalho NWN, para uma entrevista esclarecendo diversas questões sobre os temas.
Nestor W. Neto é de Aparecida/GO e, além de ser técnico em segurança do trabalho e editor do blog, trabalha como coach, palestrante, desenvolve cursos na área, estuda engenharia de produção e possui dois livros lançados sobre segurança e saúde no trabalho. Com uma vasta experiência no tema e presença online que atinge mais de 100 mil seguidores, enxergamos nele a pessoa ideal para dividir com nossos leitores algumas informações sobre insalubridade e aposentadoria especial.
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1) Apesar de não ser uma prova “absoluta” para a aposentadoria especial, como o ppp e o ltcat, muitas pessoas perguntam sobre o adicional de insalubridade. Em quais condições um profissional recebe adicional por insalubridade?
Nestor: O direito ao adicional de insalubridade nasce da combinação de duas condições: Estar exposto a algum agente agressivo ao organismo no ambiente de trabalho, desde que tal exposição esteja caracterizada na NR 15. Se houver limite de tolerância para tal exposição ao agente agressivo na NR 15, esse limite tem que ser ultrapassado.
O adicional de insalubridade incide sobre o salário mínimo conforme determina a NR 15. E pode ser de 40%, 20% e 10%.
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2) A questão da insalubridade e periculosidade também leva a dúvidas sobre acidentes de trabalho. Como é regulamentado o que pode ou não ser considerado acidente de trabalho?
Nestor: O acidente de trabalho que chamamos de acidente “típico” por força do artigo 19 da lei 8213/91 é aquele que acontece no trabalho ou à serviço da empresa, causando lesão corporal ou perturbação funcional. A lei nos deixa atentos para algo importante: para ser acidente de trabalho ou de trajeto tem que ter lesão corporal ou perturbação funcional…
O acidente de trajeto é uma equiparação ao acidente de trabalho previsto pela lei 8213/91, artigo 21, letra “d”. Tal item determina que é acidente de trajeto todo acidente que ocorre no trajeto da residência para o trabalho, e do trabalho para a residência. Hoje em dia já temos juízes considerando também o trajeto trabalho para escola e escola para casa como acidente de trajeto.
3) Gostaríamos que você falasse um pouco sobre o LTCAT. O que é, para que serve e como é realizado?
Nestor: O LTCAT – Laudo Técnico das Condições Ambientais do Trabalho, é o laudo que existe com o fim de determinar se na empresa existe atividade que gere Aposentadoria Especial. Aposentadoria especial ocorre quando o trabalhador tem que se aposentar mais cedo por ter trabalhado em exposto a algum agente agressivo ao organismo.
A elaboração do LTCAT só pode ser feita por Engenheiro de segurança do Trabalho ou Médico do Trabalho conforme determina a lei 8213/91 em seu artigo 58 inciso 1. O LTCAT consiste em uma avaliação do ambiente de trabalho a fim de determinar os riscos que o trabalhador está exposto. Essa avaliação pode ser qualitativa ou quantitativa e isso depende do agente de risco em questão e da legislação relacionada.
4) Os Equipamentos de Proteção Individual (EPI) são obrigatórios por lei? Em que casos existe obrigatoriedade?
Nestor: A empresa é obrigada a fornecer aos empregados, gratuitamente, EPI adequado ao risco, em perfeito estado de conservação e funcionamento, nas seguintes circunstâncias:
a) sempre que as medidas de ordem geral não ofereçam completa proteção contra os riscos de acidentes do trabalho ou de doenças profissionais e do trabalho;
b) enquanto as medidas de proteção coletiva estiverem sendo implantadas; e,
c) para atender a situações de emergência.
Como vimos acima o EPI sempre deve ser utilizado quando existe trabalho em um ambiente que oferece risco ao trabalhador. Vale ressaltar que o EPI é a última linha de desejo, ou seja, ele só deve ser indicado se não houver formas de neutralizar o risco na fonte, na trajetória ou administrativamente.
Exemplo: se temos ruído no ambiente de trabalho a sequência a ser pensada passaria por:
– Retirar o equipamento ruidoso de dentro da fábrica: se fosse um compressor, por exemplo, as mangueiras poderiam trazer o ar comprimido para dentro da fábrica. Com isso o afastamento do compressor não traria prejuízo algum para a produção.
– Neutralizar o ruído na fonte: poderia fazer o enclausuramento da fonte de ruído com material isolante.
– Revezamento: poderia revezar o trabalho na área de ruído. Assim cada trabalhador seria exposto a doses menores de ruído.
– Fornecer protetor auditivo: se todas as demais medidas não forem possíveis, resta ao empregador fornecer o protetor auditivo.
5) Quem deve providenciar o EPI é a empresa ou o empregado?
Nestor: Segundo a NR 6, no item 6.3, a empresa é obrigada a fornecer EPI ao trabalhador gratuitamente. Quando ela permite que o trabalhador compre EPI para o uso, pode ter problemas sérios com a justiça no futuro. Já vi vários casos julgados nesse sentido.
6) O uso do EPI elimina o adicional por insalubridade?
Nestor: Pode eliminar… Para ser juridicamente seguro para a empresa, além de fornecer o EPI adequado e treinamento, a empresa precisa provar que realmente o EPI está eliminando, ou pelo menos reduzindo, o risco para nível abaixo do limite de tolerância da NR 15. Mas o assunto é polêmico. A CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) nos diz que:
Art . 191 – A eliminação ou a neutralização da insalubridade ocorrerá:
I – com a adoção de medidas que conservem o ambiente de trabalho dentro dos limites de tolerância;
II – com a utilização de equipamentos de proteção individual ao trabalhador, que diminuam a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância.
O simples fato de utilizar EPI não garante que o adicional seja cortado. Para comprovar a eficácia da proteção, e aí sim elimina, o direito ao adicional de insalubridade, temos alguns exemplos:
- Se for insalubridade por exposição a algum produto disperso no ar é possível fazer testes de vedação dos respiradores (conhecidos com máscaras).
- Se for insalubridade por exposição ao ruído é possível comprovar a eficiência da proteção através dos exames de audiometria feitos com regularidade e critério da NR 7 e do Médico do Trabalho.
O importante é ter em mente que a neutralização da insalubridade é possível com EPI. Para tanto a empresa deve fornecer EPI ao trabalhador, treiná-lo e comprovar sua eficácia no controle do agente de risco.
7) No caso da Aposentadoria Especial, o direito ao benefício se extingue com o uso de EPI?
Nestor: Pode se extinguir ou não. É importante tomar o mesmo cuidado que indicamos para eliminação do direito a insalubridade.
8) O que deve ser feito se a empresa se recusar a providenciar o EPI ou se o trabalhador se recusar a utilizar?
Nestor: Quando a empresa se recusa a comprar o EPI: para não faltar, é importante que o gestor dos EPIs faça um levantamento mensal da quantidade de equipamentos utilizados. Assim ele terá uma média de equipamentos utilizados mensalmente.
Muitos profissionais que fazem a gestão de EPI se esquecem que a empresa trabalha com planejamento, ou seja, se não planejar a compra do EPI toda vez que precisar comprar pode ter aquele sufoco…
Além de planejar, o profissional da gestão dos EPIs tem que ser um “cara” de argumentos. A linguagem universal que o empregador escuta, em geral é “lembrar que ele pode ter prejuízo”.
Quando perceber que o empregador não quer comprar EPI, temos que mostrar itens normativos que provem que o EPI é obrigação da empresa. Outra boa pedida é mostrar empresas que perderam rios de dinheiro porque não forneceram EPIs ao seu empregado. Existem centenas de processos judiciais julgados que podemos acessar facilmente pela internet.
A última forma é mostrar que a empresa pode ser multada pelo Ministério do Trabalho porque os trabalhadores não estão utilizando EPIs.
Quando o trabalhador se recusa a utilizar o EPI: Do ponto de vista normativo temos:
NR 6.7.1 Cabe ao empregado quanto ao EPI:
- a) usar, utilizando-o apenas para a finalidade a que se destina;
- b) responsabilizar-se pela guarda e conservação;
- c) comunicar ao empregador qualquer alteração que o torne impróprio para uso; e,
- d) cumprir as determinações do empregador sobre o uso adequado.
Um dos grandes problemas existentes, é que muitos empregadores acreditam que a única responsabilidade é fornecer o EPI. Isso está completamente errado!
NR 6.6 Responsabilidades do empregador.
6.6.1 Cabe ao empregador quanto ao EPI :
- a) adquirir o adequado ao risco de cada atividade;
- b) exigir seu uso;
Não basta fornecer o EPI. Tem que exigir o uso!
Treinamento: a empresa tem que treinar o trabalhador para que o mesmo saiba como utilizar, e como armazenar o EPI, conforme determina a NR 6, item 6. letra “d”.
Orientação: a empresa deve orientar o trabalhador continuamente.
Como o dever da empresa não se restringe a fornecer o EPI, o empregador precisa ter alguém na equipe capaz de fazer abordagens. Fazer abordagens “no chão de fábrica” sempre que um trabalhador for encontrado não utilizando EPI.
Punição: o último estágio, só aplicado se tudo falhar… Sempre que na base da conversa não conseguir com que o trabalhador cumpra a norma de utilizar o EPI, à empresa pode apelar para a punição. Assim como o trabalhador tem o direito ao EPI ele tem o dever de utilizá-lo. É interessante que na Ficha de EPI e na Ordem de Serviço assinada pelo trabalhador tenha um termo de ciência de uso do EPI. No termo ele deve se comprometer utilizar o equipamento, e ainda ciente de que pode ser punido se não o fizer.
Se resguardar: é importante que a empresa se resguarde comprovando que entrega os EPIs como as normas trabalhistas determinam. Uma forma de provar é sempre preencher a Ficha de EPI na retirada do equipamento.
9) De que formas um Técnico de Segurança do Trabalho pode ajudar quem tem direito a benefícios relacionados à insalubridade como a aposentadoria especial?
Nestor: Para ter direito à insalubridade tem que estar exposto a agente agressivo à saúde, em nível acima do limite de tolerância (se houver) como descrito pela NR 15. Sendo assim, é importante que o profissional da área de Segurança do Trabalho oriente o trabalhador no sentido de mostrar que é preciso uma análise do ambiente de trabalho, para depois se confirmar ou não o direito ao respectivo adicional.
O trabalhador tem o direito se saber se o ambiente é insalubre, perigoso ou não e, ainda, até que ponto o risco está acima do limite de tolerância da NR 15. O custo para tal levantamento deve ficar a cargo do empregador (exceto em casos de autônomos, evidentemente). Podem fazer esse levantamento o Engenheiro ou Médico do Trabalho, conforme determina a NR 15, no item 15.4.1.1.
No caso de acidente de trabalho, para ter direito aos benefícios previdenciários é importante haver caracterização, haver nexo entre acidente e lesão (agravo à saúde). Tal ligação pode ser feita através do CAT (Comunicado de Acidente de Trabalho) conforme artigos 22 e 23 da Lei 8.213/91. O trabalhador que sofreu acidente de trabalho ou de trajeto tem direito ao CAT sem custo algum. E se a empresa não emitir, podem fazê-lo o médico que o atendeu, o sindicato, o próprio acidentado ou qualquer autoridade pública. O CAT é o primeiro passo para o trabalhador conseguir o benefício acidentário da Previdência Social.
NEM TODO AGENTE DE INSALUBRIDADE GARANTIRÁ TAMBÉM DIREITO A APOSENTADORIA ESPECIAL
Um item que vale ressaltar, é que insalubridade e aposentadoria especial são coisas parecidas, mas distintas. Nem sempre haverá ligação entre elas. A insalubridade é trabalhista (Ministério do Trabalho) a aposentadoria é previdenciária (Previdência Social).
Nem todo agente insalubre gera aposentadoria especial. Cito como exemplo o ambiente de trabalho onde o trabalhador trabalha molhado. Esse mesmo terá direito a insalubridade conforme o anexo 10 da NR 15, mas não terá direito à aposentadoria especial.
Eduardo Koetz
Eduardo Koetz, advogado inscrito nas OAB/SC 42.934, OAB/RS 73.409, OAB/PR 72.951, OAB/SP 435.266, OAB/MG 204.531, sócio e fundador da Koetz Advocacia. Se formou em Direito na Universidade do Vale do Rio dos Sinos e realizou pós-graduação em Direi...
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